A água, o fogo, a terra e o ar pensaram em deixar uma recordação que perpetuasse através das idades a felicidade de seu encontro. Resolveram criar alguma coisa especial que, composta de fragmentos de cada um deles harmonicamente combinados, fosse também a expressão de suas diferenças e independência, e servisse de símbolo e exemplo para o homem. Eu porei as melhores forças de minhas entranhas - disse a terra - e alimentarei suas raízes. Eu porei as melhores linfas de meus seios - disse a água - e farei crescer sua haste. Eu porei minhas melhores brisas - disse o ar - e tonificarei a planta. Eu porei todo o meu calor - disse o fogo - para dar às suas corolas as mais formosas cores. Fibra sobre fibra foram construídas as raízes, a haste, as folhas e as flores. O sol abençoou-a e a planta deu entrada na flora regional, saudada como rainha. Quando os quatro elementos se separaram, a Flor de Lótus brilhava no lago em sua beleza imaculada, e servia para o homem como símbolo da pureza e perfeição humana. Tal como a flor do lótus cresce da escuridão do lodo para a superfície da água, abrindo suas flores somente após ter-se erguido além da superfície, ficando imaculada de ambos, terra e água, que a nutriram - do mesmo modo a mente, nascida no corpo humano, expande suas verdadeiras qualidades (pétalas) após ter-se erguido dos fluidos turvos da paixão e da ignorância, e transforma o poder tenebroso da profundidade no puro néctar radiante da consciência Iluminada. Se o impulso para a luz não estivesse adormecido na semente profundamente escondida na escuridão da terra, o lótus não poderia se voltar em direção à luz. Se o impulso para uma maior consciência e conhecimento não estivesse adormecido mesmo no estado da mais profunda ignorância um Iluminado nunca poderia se erguer da escuridão.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Não chore pelo leite derramado



Todos os dias nós nos lembramos de coisas que nos causaram arrependimentos: um hobby adorado que foi abandonado, uma viagem desejada que não aconteceu, um afeto que não foi expressado no seu tempo justo.
Como a maioria daquilo que nos arrependemos, essas histórias não resistem a uma análise mais apurada. “Toda escolha inclui uma perda”. Perde-se de um lado, mas ganha-se de outro. Lamenta-se a perda sem considerar o ganho que, inclusive, pode não ser imediato nem aparente, mas que depois revela-se muito maior.
E se o que perdemos for melhor do que o que ganhamos, isso também faz parte do jogo. O problema é que odiamos perder.
São as más experiências e as perdas, quando admitidas plenamente e saboreadas em seu gosto amargo, que nos ensinam a viver. Elas nos tornam mais humanos, falíveis, flexíveis.
É desse ponto frágil que podemos experimentar a compaixão por outros seres que perdem, e que sofrem as mesmas dores. Conhecemos o gosto de sua aflição e podemos ser solidários com conhecimento de causa. O ganho dessa fraternidade em humanidade, dessa possibilidade de compaixão pelo outro com base em nossa própria experiência, já seria suficiente para absorver muitos de nossos erros e incompreensões do passado.

Nada de julgamentos

Outro erro frequente: não podemos julgar uma decisão do passado com os olhos do presente. O que foi decidido baseou-se no nível de consciência que se tinha na ocasião. Todos nós, se tivessemos o olhar que temos hoje  de alguns desvios de rota que fizemos no passado, seria pouco provável que nos perdêssemos neles. Mas nos esquecemos disso, geralmente por causa do peso da culpa: “A culpa e o perfeccionismo são as duas piores doenças da alma”. Nós nos cobramos por uma perfeição que não existe na espécie humana.
A palavra arrependimento em grego, é metanoia, que quer dizer apenas “mudança de direção”. Erramos, admitemos o erro, procuramos remediá-lo e mudamos de caminho. Simples assim sem cobranças.
É um longo aprendizado aprender a lidar com o erro de uma maneira firme, mas sem peso. Momentos de silêncio para acalmar o espírito e nos descondicionar da culpa é um caminho.
Viver é fazer escolhas, e algumas delas incluem abrir mão do prazer imediato.  Para ser amados e aceitos, ou por amar mais aos outros que a nós mesmos, muitas vezes fazemos grandes sacrifícios.
A questão real é que muitas vezes isso é feito como uma espécie de troca. Nós nos sacrificamos pelos outros, mas achamos que eles nos devem na mesma proporção. Quando não há reconhecimento e mesmo o sacrifício não é aceito, é comum a pessoa se arrepender amargamente. Não podemos decidir pelos outros. Eles tem todo direito de não concordar com aquilo que julgamos ser bom para eles.
Por isso, ser mais fiel a si mesmo e só fazer sacrifícios de forma incondicional pode ser um bom norte para não se lamentar mais tarde.
Abrir mão do controle, ser comum e imperfeito, fazer algo que nunca tenha feito, ser mais sociavel com os amigos, sobreviver ao amor e às perdas, refletir sobre tudo mas não se aprrepender de nada são caminhos a seguir.
Amar a vida e não se arrepender é dizer um sim incondicional a exatamente como ela é: com sua dose de beleza, natureza e magia tanto quanto sua violência, maldade e angústia. E, se algum dia nos arrependermos de nossa ousadia, ilusão e engano, também não há problema. O mundo é assim. Está tudo certo.


Revista Vida Simples


Maio 2013
 

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